ENGULA O CHORO! SORRIA!
- JEFFERSON LIMA
- 12 de mar.
- 3 min de leitura

Com entusiasmo, acompanhei a trajetória do filme Ainda Estou Aqui até a conquista do Oscar de Melhor Filme Internacional. Nosso primeiro Oscar! Um marco importante para o nosso cinema, que merece ser reconhecido e celebrado, pois, há muito tempo, vem produzindo grandes obras com recursos limitados, em um país onde as salas de exibição raramente privilegiam produções nacionais. Infelizmente, devido ao escasso apoio e à divulgação restrita, grande parte de nossas produções passa despercebida pelo público. E não foi só o Oscar: tivemos também o Globo de Ouro para Fernanda Torres, outro feito inédito que merece ser celebrado!
Começamos 2025 com o pé direito e cheios de esperança! Esperança de que o cinema nacional ganhe um novo impulso a partir de agora; esperança de que os jovens, embalados pela "febre do Oscar", se interessem mais pela nossa história, com suas conquistas, desafios e episódios marcantes. E que, a partir disso, as futuras gerações se tornem mais conscientes, críticas e prósperas.
Aproveitando o sucesso do filme, dediquei-me à leitura do livro que deu origem à obra cinematográfica.
Eu já havia sido tocado pela emblemática cena da fotografia, amplamente reproduzida nas inúmeras reportagens sobre o filme, na qual a personagem Eunice Paiva pede para todos sorrirem. Um gesto de resistência, uma maneira de não alimentar o sensacionalismo da imprensa com a imagem de uma família abatida.
Logo nas primeiras páginas, Marcelo Rubens Paiva, autor e filho da protagonista, revela a essência daquele momento e a força de sua mãe:
“Ela nunca faria uma cara triste. Bem que tentaram. Por anos, fotógrafos nos queriam tristes nas fotos. Tivemos nossa guerra fria contra o pieguismo da imprensa. (...) Não faríamos o papelão de sairmos tristes nas fotos. Nosso inimigo não iria nos derrubar. (...) O crime foi contra a humanidade, não contra Rubens Paiva. Precisamos estar saudáveis, bronzeados para a contraofensiva. Angústia, lágrimas, ódio, apenas entre quatro paredes. Foi a minha mãe quem ditou o tom, ela quem nos ensinou.” (*)
Imagino que Eunice Paiva tenha sido criada por uma mãe que, como tantas que conhecemos, dizia aos filhos: "Engula esse choro!" E levou esse ensinamento às últimas consequências.
Aproveitando que estamos no mês dedicado à celebração das mulheres, quero erguer um brinde às inúmeras que engolem o choro todos os dias, pelos mais variados motivos. Às mulheres que se desdobram em múltiplos papéis: mães, administradoras do lar, empreendedoras e trabalhadoras, estudantes, esposas, companheiras, cuidadoras de pais idosos, e tantas outras funções que nem caberiam todas aqui. Nunca saberemos o peso que carrega um sorriso emoldurado por uma maquiagem impecável.
No entanto, quero ampliar essa reflexão para todos nós, enquanto seres humanos, vivendo em uma era em que o desempenho é constantemente medido e a meritocracia implacável penaliza quem não consegue cumprir metas pré-estabelecidas. Parece não haver espaço para fraqueza: é preciso sair da zona de conforto, se superar, atender a expectativas, percorrer milhas extras e, ao final, exibir o sorriso do vencedor. Mas a que custo?
Muitas lágrimas são digeridas junto com pílulas ansiolíticas.
Meu convite é para que o sorriso no rosto seja o reflexo de um coração em paz. Que possamos reconhecer nossas limitações e compreender que nem sempre será possível atender a todas as expectativas, sejam elas próprias ou impostas por outros.
Que haja tempo para o descanso, para o lazer, para um sorvete e um algodão-doce na praça, para a pipoca no cinema e para uma tarde sem compromissos. Os problemas continuarão à nossa espera no dia seguinte, mas hoje não. Hoje será o dia de sorrir para a melhor foto e gargalhar ao lado das pessoas que amamos.
E quando não for possível conter o choro, que o rosto molhado, entre soluços, ecoe uma prece, na certeza de que Aquele que prometeu seu Espírito Consolador, enxugará dos nossos olhos todas as lágrimas.
Por isso, sorria!
(*) Ainda Estou Aqui; Paiva, Marcelo Rubens
17ª reimpressão, pág. 39
Editora Schwarcz S.A
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Jefferson, seu texto vai além de celebrações e críticas: nos convida a refletir sobre os sorrisos que escondem dores, e propõe um caminho de paz interior, onde as exigências do mundo cedem espaço para momentos de simplicidade e alegria genuína. É um tributo não apenas ao cinema, mas à essência da humanidade. Um lembrete tocante para sorrirmos, mesmo que às vezes com lágrimas nos olhos. Gostei imenso! Abraço!👏
Lindo texto e o tema fantástico. Não poderia surgir algo tão sensacional como esse filme: "Ainda estou aqui." Eu que vivi a ditadura anos sessenta e setenta sem ter a mínima ideia de que era ditadura, pois era proibido falar em ditadura, estou revivendo um tempo em que não tinha voz. Se fosse hoje iria rasgar a boca. Amei, Jefferson, quando falou do sorriso. Hoje mesmo, amanhã não sabemos se pertence a nós. Parabéns, Maria Anésia.
Caro amigo e poeta...
Adorei sua reflexão, seu olhar ante uma obra prima brasileira, obra essa, que merece todas as Palmas..
Você foi cirúrgico em seu texto...
Parabéns!
Sensacional seu texto, Jefferson. Você costurou com maestria dois assuntos importantes: a história de Eunice Paiva e a história de tantas Eunices brasileiras. Parabéns!
O filme Ainda Estou Aqui,sem dúvidas,se tornou um marco divisório entre o antes e o depois do Oscar...
Mas é para a Eunice Paiva a minha eterna reverência. Uma mulher que se revelou extraordinária, gigante dentro do seu silêncio.
Namastê!