NÚMERO DESCONHECIDO: O DRAMA HUMANO POR TRÁS DAS TELAS
- CARLA KIRILOS
- 22 de set.
- 3 min de leitura

Assisti ao documentário “Número Desconhecido: Catfishing na Escola” e não pretendo aqui entregar spoilers, mas compartilhar a inquietação que ele me causou. Disponível na Netflix, o filme expõe, com precisão quase clínica, como a vulnerabilidade humana pode ser manipulada no ambiente virtual.
O caso parte de uma série de mensagens ameaçadoras recebidas por Lauryn Licari, então com apenas 13 anos, e também por seu namorado, Owen. Durante quase dois anos, ambos viveram sob uma perseguição virtual maldosa e dolorosa. Quando, por fim, a polícia se envolve no caso, descobre-se que as mensagens eram enviadas a partir de um aplicativo comum, capaz de ocultar números de telefone. Esse detalhe se tornou o fio condutor da investigação, até a revelação surpreendente da identidade por trás de tudo.
A cada mensagem exibida na tela, confesso que senti o mesmo desconforto vivido pelos personagens reais. O “desconhecido”, afinal, não se limita ao número oculto. Ele é também a própria condição de se relacionar em um mundo mediado por telas, onde identidade e intenção se borram com facilidade.
O catfishing — criação de identidades falsas no ambiente digital — surge como um sintoma desta era: perfis que seduzem, criam laços, mentem e deixam cicatrizes emocionais. Em certos casos, a linha entre crime e doença se estreita. A síndrome de Munchausen, por exemplo, encontra nas redes sociais um palco perfeito para narrativas de enfermidades inventadas, tratamentos falsos e histórias de sobrevivência simuladas. Muitas vezes, o que se busca não é dinheiro, mas cuidado, empatia e o simples fato de ser visto.
E aqui está uma das camadas mais perturbadoras do documentário: quando a manipulação não parte de estranhos, mas, provavelmente de pessoas muito próximas. Se, de um lado, a internet amplia a exposição a contatos desconhecidos, de outro, revela como laços íntimos também podem ser atravessados por máscaras, segredos e distorções emocionais. E o choque maior talvez esteja justamente nisso: perceber que, às vezes, o perigo não vem de fora, mas pode estar ao nosso redor.
Essa é, talvez, a reflexão mais urgente do filme: nossa saúde mental e o impacto devastador da perda de confiança. Vivemos entre a necessidade de conexão e o medo constante de sermos enganados. As vítimas retratadas não carregam apenas as marcas da fraude, mas o trauma da desconfiança. Afinal, depois de ser traído por um amor inexistente, por uma amizade fictícia — ou até mesmo por quem menos esperamos —, como reconstruir vínculos reais?
O suspense de Número Desconhecido não está apenas em descobrir quem está do outro lado da tela. Ele se revela também em perceber quantos “números desconhecidos” rondam nossas próprias vidas: solicitações de amizade, mensagens inesperadas, contatos sem rosto. O ciberespaço ampliou nossas possibilidades de encontro, mas também multiplicou formas de solidão mascarada.
No fundo, este não é apenas um documentário sobre golpes virtuais. É um retrato do nosso tempo: uma época em que identidades se fragmentam e o desejo de ser visto transforma pessoas em personagens. A história de Lauryn e Owen não nos permite rir do infortúnio alheio; pelo contrário, obriga-nos a encarar nossa própria fragilidade diante da busca por pertencimento — mesmo quando escondidos atrás de uma tela.
A Bíblia já nos adverte: “E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará” (João 8:32). No contexto atual, esse versículo ecoa como antídoto e alerta. Porque, se o documentário mostra até onde a mentira digital pode chegar, também nos lembra que a verdade é o único caminho capaz de reconstruir confiança — seja no espaço virtual ou dentro de nossas próprias casas.
Entre telas, segredos e mentiras, o documentário revela mais do que um caso policial: ele expõe dilemas do nosso tempo. O convite está feito — assista e veja até onde a verdade pode estar escondida. Suas conclusões podem ser tão perturbadoras quanto necessárias.
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Carla, aceitei sua dica e vi o documentário, Que impressionante! Foi muito bom ler seu texto, Parabéns! Júlia
UAU! Fiquei curiosa. Não assisiti ainda, mas com certeza, após ler seu texto verei. O tema é atual, preocupante ( jovens expostos) e, infelizmente mais uma porta maldosa aberta pela internet. Ana
Obrigada, Carla! O texto aborda um assunto contemporâneo e que atinge muitos adolescentes. Vou aceitar sua dica e assistir o documentário. Beijos, Janete
Convite aceito, Carla! Vou assistir. Assunto muito atual e que não pode ser ignorado. Nós, que estamos nos adaptando aos novos tempos, precisamos nos atualizar e, ao mesmo tempo, orientar , sem terrorismos, à nova geração. Abração!
Carla,
Seu texto me lembrou de Bauman, quando ele fala das relações líquidas do nosso tempo, e que tempos vivemos! Recentemente uma pessoa próxima confessou que iniciou um relacionamento com uma IA. Isso prova os dilemas humanos da atualidade: queremos ser vistos, amados, mas nos escondemos atrás das telas. Fiquei curiosa para assistir esse documentário.
Parabéns pelo texto e pela reflexão que gera.
Abraço,
Ilma Pereira